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terça-feira, 29 de novembro de 2011

Texto do acadêmico Tiago Mossmann para a disciplina Literatura Portuguesa I neste semestre

A carta de amor e a confissão
                                                                                                          
Tiago Roberto Mossmann[1]

Alívio em um momento, ódio em outro, desabafo e clausura simultaneamente. Ideias opostas e exageradas demonstram o espírito barroco da obra “Cartas Portuguesas”, de Mariana Alcoforado. Por meio de cinco cartas a um cavaleiro francês, com o qual a freira Mariana teve um relacionamento, percebem-se as mágoas, a culpa, o rancor. Apesar de tudo isso, há um resquício de esperança de que o romance possa um dia dar certo.
No decorrer da obra, observamos que a freira teve relacionamento não convencional de quem usa o hábito, pois, nos encontros com seu amado francês, conseguimos perceber que os dois tiveram relações sexuais. Dessa atitude, o sofrimento fica presente apenas para mulher, que vê em relação ao comportamento e às respostas a suas cartas apenas indiferença por parte de seu amado. À Mariana, restaram a clausura e os seus pesares.
Segundo Rector, a maioria das mulheres “[...] sempre foram representadas como seres humanos passivos, manipulados pela vontade do homem; seu destino era a loucura, a morte ou o hábito religioso” (1999, p.15). Mariana vivenciou bem a situação descrita por Rector, pois foi um joguete na mão do amado e sua alternativa de vida foi o convento. Isso sem contar as repressões que certamente ela poderia ter nesse ambiente, caso fosse descoberto o seu romance. A descoberta do romance poderia ter ocorrido através da confissão exposta nas cartas. Então, até que ponto essa confissão trouxe liberdade ou clausura à Mariana? Esse aspecto será o principal ponto a ser analisado neste trabalho.
Em um primeiro momento, a confissão de Mariana sobre seu amor parece uma forma de alívio. Todavia, a confissão também serve para reforçar a relação de poder que o outro pode exercer sobre alguém, uma vez que o outro punirá ou perdoará esse alguém independente da vontade desse último, como postula Foucault:

A confissão é um ritual de discurso onde o sujeito que fala coincide com o sujeito do enunciado; é, também, um ritual que se desenrola numa relação de poder, pois não se confessa sem a presença ao menos virtual de um parceiro, que não é simplesmente o interlocutor, mas a instância que requer a confissão, impõe-na, avalia e intervém para julgar, punir, perdoar, consolar, reconciliar (FOUCALT, 1984, p.61).

A sociedade ocidental é extremamente confessional. “Confessa-se – ou se é forçado a confessar” (idem, p.59). Desde a Idade Média, a confissão passou um papel muito forte para tentar se produzir a “esperada verdade”. Os tribunais da Inquisição utilizaram-se da confissão como uma das formas para manter o poderio da Igreja.
Bem ou mal, a partir disso, “[...]a confissão passou a ser, no ocidente, uma das técnicas mais altamente valorizada para produzir a verdade” (idem), podemos perceber o reflexo que isso tem na Literatura através dos tempos, sobretudo na poesia atual, que é bastante confessional.

O homem, no ocidente, tornou-se um animal confidente. Daí, sem dúvida, a metamorfose na literatura: de um prazer de contar e ouvir, dantes centrado na narrativa heróica ou maravilhosa das “provas” de bravura ou de santidade, passou-se a uma literatura ordenada em função da tarefa infinita de buscar, no fundo de si mesmo, entre as palavras, uma verdade que a própria forma de confissão acena como sendo inaccessível (Ibidem).

Sem a confissão do amor de Mariana, as “Cartas portuguesas” não existiriam. Baseando-nos na citação mencionada anteriormente, podemos dizer que Mariana busca uma verdade através da confissão de seu amor. Essa verdade serve ora para aliviá-la, quando critica seu amado, ora para aprisioná-la a ele, pois a própria crítica por instantes alimenta o sentimento que a faz prisioneira do cavaleiro francês. Portanto, carta de amor e confissão estão intimamente ligadas. Diante dessas duas atitudes, brotam diversos outros sentimentos profundamente humanos e, como tais, contraditórios: paixão, ódio, mágoa.

Referências

Foucault, Michel. História da Sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1984.

Rector, Mônica. Mulher: objecto e sujeito da Literatura Portuguesa, Universidade Fernando Pessoa, 1999.


[1] Acadêmico do Curso de Letras das Faculdades Integradas de Taquara – FACCAT. Realizou o trabalho em questão para a disciplina de Literatura Portuguesa I, sob a orientação da Professora Luciane Wagner Raupp.

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